Desafios de CT&I

É muito grave a situação da ciência e tecnologia no país. A frase foi a tônica da palestra do presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o físico Ildeu de Castro Moreira, durante o terceiro seminário preparatório para a o VIII Congresso Interno, realizado ontem (18/10), no Auditório do Museu da Vida, no Campus Manguinhos. O convidado dividiu a mesa com o coordenador das Ações de Prospecções da Fiocruz, o economista Carlos Gadelha, falou sobre CT&I e apropriação do conhecimento.

O tema foi Os Desafios da Ciência, Tecnologia e Inovação para um Projeto de Desenvolvimento e Soberania Nacional. “Esse é um tema central de subsídio para o nosso Congresso, ainda mais num contexto tão crítico para a Ciência, a Tecnologia e a Inovação”, afirmou o coordenador-geral de Gestão de Pessoas, Juliano Lima, que mediou o debate. “Estamos aqui para olhar para essa conjuntura, mas também para não nos aprisionarmos por ela e olharmos para o futuro”, disse.

Contingenciamento

O presidente da SBPC falou sobre os pontos principais da Carta aos Parlamentares Brasileiros, assinada por várias instituições de pesquisa e entregue semana passada.  “Conseguimos uma audiência pública no Congresso Nacional, com a participação de 50 parlamentares, e conseguimos ser recebidos pelo presidente do Congresso e do Senado, mas com discursos vagos”, afirmou Ildeu. O documento aponta a redução drástica do orçamento da área de CT&I, de cerca de R$ 12 bilhões em 2010/2013 para R$ 2,7 bilhões em 2017. 

Se você está vivendo uma crise econômica - e nós estamos vivendo uma crise econômica, política e fiscal -, investimento em ciência e tecnologia é essencial para sair desse ciclo de crise”, disse Ildeu. “Nós apontamos várias iniciativas da ciência brasileira e várias iniciativas de outros países, que estão indo no sentido contrário, como a China, a Índia, a Rússia, a Alemanha que fizeram um grande investimento nos últimos tempos”.

Para sensibilizar parlamentares da chamada Bancada Ruralista, o presidente da SBPC falou da importância da ciência e das universidades públicas brasileiras no desenvolvimento de tecnologias fundamentais para o agronegócio. Como exemplo, o processo de fixação de nitrogênio em plantas por meio de bactérias, que desenvolvido por universidades e pela Embrapa, que eliminou o uso de adubos nitrogenados e permitiu quadruplicar a produção de soja.

Ildeu de Castro Moreira mostrou dados positivos do investimento em programas de pós-graduação, relacionados diretamente ao aumento da produtividade científica. E se mostrou preocupado com a situação crítica do O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sem recursos para cumprir seus compromissos deste ano – entre os quais, 100 mil bolsas de Iniciação Científica de pós-graduação e pesquisa.

“Precisamos pensar em políticas e maneiras para enfrentar essas dificuldades e superar os desafios de agora e outros que não são de hoje”, afirmou o presidente da SBPC, que destacou o papel da Fiocruz não só na produção científica brasileira, mas como símbolo e referência para as demais instituições públicas da área. “O fato de estarem pensando e refletindo sobre o que fazem é importante para vocês, mas também para o Brasil, como um projeto de nação”, afirmou. Cique aqui e veja a apresentação  de Ildeu de Castro Moreira.

Transformação social

Em sua fala, Carlos Gadelha destacou o esforço da Coordenação das Ações de Prospecções da Fiocruz de produzir dados e informações. “Muitos confirmam as hipóteses que estamos trabalhando no campo do desenvolvimento, saúde e inovação”, afirmou. 

“A inovação não é só técnica, é um processo político de transformação social”, resumiu, referindo-se à definição de Celso Furtado: O desenvolvimento econômico pode ser definido como processo de mudança social pelo qual o crescente número de necessidades humanas, pré-existentes ou criadas pela própria mudança, são satisfeitas através de uma diferenciação no sistema produtivo, gerado pela introdução de inovações tecnológicas.

Na sua apresentação, o coordenador mostrou números sobre produção industrial e patentes, e sua distribuição mundial. “A perspectiva aqui é a assimetria, heterogeneidade”, disse, indicando que são três os pilares na base do processo de desenvolvimento estrutural. “O primeiro é a capacidade de geração de conhecimento e inovação, que se manifesta nos sistemas intensivos de ciência e tecnologia.  A globalização é assimétrica”, afirmou Gadelha, que analisou criticamente as medidas econômico-fiscais recentes. “O ajuste reforça essa ampliação do hiato”.

O segundo pilar é o sistema de bem-estar social. “O sistema de bem-estar está sob ataque, o que envolve uma forte transformação estrutural. Mudar numa direção ou em outra nossa atenção básica é mudar na veia o nosso sistema universal de saúde, para o bem ou para o mal, como as recentes medidas sugerem”, disse. O terceiro pilar, segundo o coordenador, é a sustentabilidade do desenvolvimento.

“Essas três dimensões - conhecimento e inovação; bem-estar e sustentabilidade – envolvem mudança estrutural, modelo de sociedade, disputa política por interesses e por projetos de desenvolvimento”, afirmou Carlos Gadelha. “Para nortear a política de desenvolvimento C&T e industrial, qual é o modelo de sociedade que queremos e que terá hegemonia da arena política? Ou seja, a ciência, a tecnologia e inovação não é neutra, é preciso saber qual é o modelo de sociedade pretendido”, disse.

Apropriação privada

Para o economista, a transformação política, social e ambiental está estreitamente relacionada com a dinâmica industrial. “Eu não tenho de um lado as políticas sociais e de outro a política industrial. Essas dimensões são endógenas”, para em seguida citar dados levantados pela Coordenação, organizadas em mapas e gráficos. “Atividades econômicas complexas são distribuídas de modo desiguais no globo. Nas patentes depositadas, mais uma vez se reproduz a assimetria global, com forte “, apontou.

Sobre a desigualdade no campo da saúde, Carlos Gadelha destacou duas grandes preocupações. “A primeira preocupação é que o esforço de inovação está concentrado em quem já está na frente. A segunda é o crescente esforço de apropriação privada sobre o conhecimento. Ou seja, a geração de conhecimento está concentrada no mundo e o esforço de apropriação privada sobre o conhecimento também está concentrado no mundo. Clique aqui e veja a apresentação de Carlos Gadelha.