Seminário destaca desafios para o futuro da Fiocruz

Foi realizado na última terça-feira, 1º de dezembro, o primeiro seminário preparatório para o 6º Congresso Interno da Fundação Oswaldo Cruz. Com o tema Fiocruz: trajetória histórica, atualidades e projeto de futuro, o evento promovido pela Comissão Organizadora do Congresso Interno teve como convidados o presidente da Fundação, Paulo Gadelha, e o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães. Na primeira edição dos seminários preparatórios foram abordados diversos temas, com especial destaque para as dificuldades e limitações de gestão e investimento representados pelo atual modelo jurídico da Fiocruz. Outro ponto ressaltado foi a adoção de novos modelos jurídicos como forma de preparar a Fundação para os desafios que se imporão nas próximas décadas. O evento aconteceu na Tenda da Ciência, no campus de Manguinhos, e foi transmitido ao vivo pela Rede Fiocruz.

Segundo Pedro Barbosa, vice-presidente de Gestão e Desenvolvimento Institucional e coordenador geral da Comissão Organizadora do 6º Congresso Interno, este primeiro seminário teve como objetivo esclarecer e embasar a discussão sobre os desafios para o futuro da Fiocruz e sobre a necessidade de mudanças na estrutura da Fundação – tema relevante do processo congressual, que terá plenárias entre 7 e 9 de abril de 2010.

Na abertura do Seminário, o presidente da Fiocruz ressaltou o caráter democrático do Congresso Interno e sua importância para a definição dos rumos da Fundação. “O processo congressual, experiência única no setor público, transforma todos os funcionários em agentes com o mesmo status, com a mesma responsabilidade de definir o rumos da Fiocruz”, afirmou. “Em todas as edições anteriores, sempre houve uma sensação de transformação, de estarmos dando um salto histórico, que parece se intensificar nesta edição. O 6º Congresso Interno pede uma especial capacidade de reflexão e de produção colaborativa de alternativas para garantir o futuro dessa instituição.”

Gadelha destacou o papel central ocupado hoje pela Fiocruz e a importância de um pensamento estratégico capaz de prepará-la para as próximas décadas. “Quais serão os desafios enfrentados pela saúde e pela ciência em 2030? Certamente teremos outras grandes questões, outras doenças e outras bases tecnológicas”, analisou. “Precisamos estar preparados para entender e nos adaptar a estas mudanças ou teremos que correr atrás do prejuízo no futuro. A Fiocruz tem hoje uma carga de responsabilidade imensa para a vida do país e está sendo exigida pelo Estado brasileiro e pela sociedade.”

Para se adaptar aos novos desafios e reforçar o papel estratégico que vem ocupando dentro do estado brasileiro nas últimas décadas, Gadelha avalia que é importante pensar na mudança do modelo jurídico da Fiocruz. “Hoje temos um modelo misto: uma autarquia ligada a uma fundação de apoio, a Fiotec. Este modelo tem nos levado a uma dependência cada vez maior em relação à Fiotec, nos criando uma grande dificuldade de fazer investimentos estratégicos e tem deixado a administração muito engessada pela vigilância dos órgãos de controle”, afirmou. “A Fiocruz precisa de novas alternativas para continuar crescendo. Hoje, 42% de nosso investimento em produção e 25% do investimento em ensino, por exemplo, vêm da Fiotec.”

No entanto, Gadelha destacou que a atuação do Tribunal de Contas da União, da Controladoria–Geral da União e do Departamento Nacional de Auditoria do SUS vem restringindo as flexibilidades e possibilidades de investimento da Fiotec e, naturalmente, engessando vários procedimentos de gestão, tornando-os ainda mais rígidos do que a própria Lei 8666/93, o que poderá dificultar ainda mais a capacidade da Fiocruz de executar seu orçamento anual. Como exemplo de novos e possíveis constrangimentos sobre as fundações de apoio, o presidente afirmou a existência de propostas para fazer com que o saldo financeiro anual das fundações de apoio seja recolhido à conta tesouro, o que inteferiria diretamente em muitos projetos de longo prazo da Fundação, dado a lógica imperiosa de execução orçamentária sempre dentro de cada ano e de recolhimento pelo governo dos valores não executados.

Gadelha defendeu a possibilidade da mudança de regime jurídico da Fiocruz para Empresa Estatal Especial, assumindo que a condição “especial” se daria em decorrência das características próprias da Fiocruz, sobretudo sua finalidade social (regime ainda não previsto pela legislação brasileira). Porém, destacou que existem outras possibilidades, como a busca por uma maior competência na utilização de mecanismos já possibilitados pelo aparato legal e normativo existente. Ele destacou que a discussão do Congresso Interno deve ser feita de modo a escolher qual alternativa será mais adequada para atender aos interesses da Fundação, sem perder de vista sua missão e suas cláusulas pétreas: o papel como instituição estratégica, pública e estatal que desempenha, sua integralidade, compromisso social, a gestão democrática e participativa da instituição e a eficiência, eficácia e efetividade institucional e gerencial da Fundação, sem esquecer do alinhamento com o SUS e a segurança dos direitos de seus trabalhadores.

O presidente explicou, ainda, como seriam as instâncias gestoras da Fiocruz caso ocorra a adoção do modelo de Empresa Estatal Especial e mostrou alguns dos pré-requisitos básicos que o projeto deveria garantir. “A estrutura de gestão seria muito parecida, com a manutenção dos Conselhos Deliberativos e do Congresso Interno. Terão que ser garantidos a segurança e equidade na relação de trabalho entre os quadros, RJU e CLT. O quadro RJU, apesar de entrar em extinção, teria seus direitos assegurados.” Outros pontos destacados seriam a garantia da autonomia para gerir o pagamento de prêmios com base em resultados e alcance de metas, para operar o plano de assistência à saúde, para patrocinar (e contribuir) entidade fechada de previdência privada e um regulamento próprio de compras e contratos.

Em seguida o representante do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, enfatizou a importância de levar em conta as características que dão identidade à Fiocruz para pensar a instituição para os próximos 20 anos e decidir o modelo de gestão. “Essa casa conseguiu não só resgatar o conceito de instituto de pesquisa orientado por missão como conquistou projeção nacional. Atua em pesquisa, ensino, produção, desenvolvimento tecnológico e vigilância em saúde e é gerida de forma democrática. Nenhuma instituição no campo da saúde no Brasil tem esse escopo”, analisou Reinaldo.
 
Num segundo momento, a plateia e os funcionários que acompanharam o debate em tempo real pela Internet puderam fazer perguntas aos convidados, tirar dúvidas e propor contribuições para o debate. Um dos temas destacados por Álvaro Nascimento, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp), foi a necessidade de mais debates a respeito da missão organizacional antes da discussão efetiva da implementação de um novo modelo jurídico na Fiocruz. Paulo César de Castro Ribeiro, diretor do Sindicato dos Servidores de Ciência, Tecnologia, Produção e Inovação em Saúde Pública (Asfoc), ressaltou que o sindicato vai participar ativamente da discussão sobre os documentos relativos ao Congresso Interno, de modo a garantir que o processo se alinhe sempre às clausulas pétreas da Instituição. André Malhão, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, destacou que o primeiro compromisso da Fiocruz sempre deve ser com a lógica do Sistema Único de Saúde e que qualquer mudança de regime jurídico proposta deve tomar isso como base. Álvaro Funcia sublinhou que os órgãos de controle estão cada vez mais bem escorados em auditorias e afins e que a Fiocruz precisa se adequar a essas novas regulações, sob pena de ficar engessada e inviável.

Outros cincos seminários já estão previstos: Políticas públicas em saúde e ciência e tecnologia: desafios para a Fiocruz; Determinantes sociais em saúde e desafios para a Fiocruz; Saúde e Desenvolvimento; SUS, desafios, perspectivas e o papel da Fiocruz; e Fiocruz, alternativas de modelos de gestão na administração pública e desafios na gestão do trabalho. 

O 2º Seminário do VI Congresso Interno, com o tema "Desenvolvimento e Saúde: o papel da Fiocruz frente os desafios para o Complexo Econômico Industrial e para o Sistema de Inovação em Saúde”, com a participação do vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, Carlos Gadelha  e  Eduardo da Motta e Albuquerque, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), está confirmado para o dia 27 de janeiro, às 14 horas, na ENSP.

07/12/2009